a dignidade da diferença
09 de Setembro de 2016

 

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 A dedicação de Giuseppe Verdi à criação da partitura de La Traviata em pouco mais de quatro semanas – mais precisamente entre a estreia de Il Trovatore em Roma, no dia 19 de Janeiro de 1853, e o dia 6 de Março do mesmo ano – ilustra bem a fecundidade do seu génio, bem como o seu desembaraço na composição. Não é esse, contudo, o seu maior feito, pois La Traviata impressiona sobretudo pelo seu estilo tão distinto da ópera anterior, Il Trovatore. Com efeito, enquanto esta última pulsa com as paixões de amor, ódio ou vingança, confinadas aos jardins palacianos, castelos ou masmorras - cenários rigorosamente apropriados ao incentivo de tais sentimentos – a primeira, pelo contrário, quando palpita é de dor e decorre em interiores burgueses, com música a condizer: viva, espirituosa e delicada, tão rica nas suas subtilezas e expressividade melódica que consegue transmitir, ainda hoje, de forma tão cortante e eloquente, as sensibilidades, esperanças e vicissitudes das suas personagens. A versão dirigida pelo maestro James Conlon, com Renée Fleming, Rolando Villazón e Renato Bruson nos principais papéis, advoga de modo convincente.

 

 

23 de Novembro de 2008

 

JAMES CARTER

 

Agora que o final do ano se aproxima e, por isso, escasseia o tempo para ir apresentando algumas das obras mais marcantes que foram publicadas durante os últimos onze meses, eis uma boa altura para falar de dois excelentes discos que fui ouvindo recentemente e que, posso garanti-lo, farão parte da minha lista dos indispensáveis do ano.

O primeiro é assinado por um músico de jazz – James Carter -, chama-se «Present Tense» e faz parte daquele género de música enganadoramente antiquada que, quanto mais se escuta, nos prende a atenção pelo classicismo, rigor musical e instrumental – James Carter é aquilo a que poderemos chamar um sobredotado -, pela abordagem e concisão histórica e, não menos importante, pela marca contemporânea que deixa em cada peça gravada.

Uma espécie de reconstrução de um edifício antigo destruído pelo tempo, onde toma forma o traço antigo do material em reconstrução – seja o bop, o romantismo ou o espírito presente de Django Reinhardt -, cujos alicerces são os excelentes músicos que acompanham o autor (o trompetista Dwight Adams, o guitarrista Rodney Jones, o pianista D. D. Jackson, James Genus no contrabaixo e Victor Lewis e Eli Fountain nas percussões) e que, com passar do tempo, vão, lenta mas seguramente, criando uma música nova e actual, através de uma leitura ecléctica, ritmicamente formidável, luxuriante e insinuante.

 

 

 

RENÉE FLEMING

 

 

O segundo disco que aconselho é a interpretação fabulosa da obra de Richard Strauss, da responsabilidade da soprano Renée Fleming. Se tudo o que escutamos é brilhante, colorido e emocionalmente avassalador, a jóia da coroa só podia ser a gravação das crepusculares «Vier Letzte Lieder/Four Last Songs» que a intérprete, acompanhada pela Orquestra Filarmónica de Munique dirigida por Thielemann, estica quase até ao infinito e que rivaliza, sem favor algum, com as lendárias gravações de Schwarzkopf e de Lisa Della Casa.

Se ambos são absolutamente indispensáveis, o disco de Renée Fleming entra directamente para a discoteca básica fundamental de qualquer melómano que se preze.

 

 

 

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