a dignidade da diferença
15 de Abril de 2009

 

E eis que chegou, finalmente, uma boa notícia para todos aqueles que amam o cinema do genial realizador espanhol, com a distribuição e edição nacional – numa caixa exclusiva da Fnac - de quatro dos seus filmes mais famosos: Los Olvidados, Susana Demonio Y Carne, Abismos de Pásion e Viridiana.

Luis Buñuel nasceu em Calanda, na província de Teruel no dia 22 de Fevereiro de 1900. Alguns dados marcantes para o crescimento da sua personalidade foram, inegavelmente, a sua associação com Lorca e Salvador Dali ao movimento ultraista, o facto de ter perdido a fé católica (aos 15 anos) quando terminou o liceu e a visão do filme Der Müde Tod do cineasta alemão Fritz Lang, obra que o impressionou profundamente e lhe fez crescer a vontade de se tornar realizador de cinema.

Igualmente importantes no seu trajecto foram a sua participação no teatro – onde se iniciou numa peça de Garcia Lorca – e a adesão, em 1928, ao movimento surrealista.

A sua entrada no mundo do cinema chegou  no ano seguinte quando concluiu, com dinheiro emprestado e baseando-se num argumento de Dali, o célebre Un Chien Andalou, considerado por muitos como o primeiro filme verdadeiramente surrealista. Com L’Âge d’Or, que estreia em 1930, consegue o seu primeiro escândalo  e outro feito notável: o de ter criado um filme que foi vítima de uma das mais prolongadas e lendárias censuras da história do cinema; entre 1930 e 1981 o filme só teve direito a exibições privadas. Estava lançado o mito e reforçada a sua reputação.

Após breves passagens pela América e por França (onde se casou), Buñuel viveu entre 1935 e 1946 um dos períodos mais obscuros e, obviamente, desconhecidos da sua longa carreira. Esse apagamento só chegou ao fim com a realização de Gran Casino (um filme musical e, simultaneamente, de aventuras), iniciando, deste modo, o seu período mexicano.

 

Se os primeiros filmes passaram, fora do México, algo despercebidos, Los Olvidados marcou (e de que maneira!) o renascimento do genial cineasta perante a crítica europeia. Estávamos no ano de 1950. Los Olvidados é um trágico e desesperado retrato da juventude mexicana dominada pela miséria, pela morte e pelo sexo. No filme habitam prodigiosas e terríveis personagens que se alimentam do eterno conflito entre a consciência humana e o fatalismo a que não conseguem escapar. Quase todos são encaminhados para a delinquência depois de expulsos do seio materno onde procuram, de forma desamparada, regressar. Desta obra soberba fica na memória, para sempre, o voto cruel do velho cego quando deseja que fossem mortos todos aqueles miúdos antes da nascença porque, para eles, não existe tempo nem espaço.  

São também do seu período mexicano outros dois dos filmes agora editados em DVD: Susana Demonio Y Carne e Abismos de Pásion.

 

 

Susana é um dos mais subversivos e incendiários manifestos cinematográficos de Buñuel. Dele guardamos a inesquecível metamorfose que uma personagem explosiva e profundamente erótica provoca no ambiente familiar que se vive numa quinta. Entre a fuga e o posterior regresso ao reformatório, a perversa Susana destrói o paraíso inicial e transforma-o num inferno diabólico. E depois ainda temos, como mais-valia suprema, a fantástica objectiva que persegue cada personagem num movimento constante, saltando de cena em cena, plano após plano, numa visão alucinante de perdição, vertigem, medo e emoção.

 

Abismos de Pásion perde, naturalmente, na comparação com Susana mas não deixa, ainda assim, de ser uma excelente e muito livre adaptação do genial Wuthering Heights (O Monte dos Vendavais), célebre romance de Emily Brontë (1818-1848).

O último dos filmes agora lançados, Viridiana, foi dirigido por Buñuel entre 1960 e 1961, quando regressou a Espanha após uma ausência de 23 anos. Viridiana é uma obra-prima tão evidente quanto escandalosa, o que não impediu a conquista da Palma de Ouro no festival de Cannes; o seu escândalo só é comparável ao de L’Âge d’Or.

Viridiana é mais uma esplêndida variação sobre as virgens perversas e muito beatas, numa fabulosa articulação entre castidade, desejo, sonho, mendicidade e loucura. Trata-se de uma obra admirável  e visualmente poderosa.

 

E para terminar esta prosa em jeito de muito resumida biografia, faço apenas uma breve referência ao período final do cineasta. Buñuel associou-se, em 1964, ao argumentista Jean-Claude Carrière e ao produtor Serge Silberman para esculpir os seus últimos oito filmes. Deste lote merecem destaque especial os fascinantes e complexos Belle de Jour e Tristana e o seu testamento final, o prodigioso Cet Obscur Object Du Désir (1977) que é, talvez, o apogeu da sua arte e um dos filmes mais assombrosos de toda a história do cinema. Para Buñuel, o sexo não seria mais do que mera diversão porque essencial era o desejo. Viria a morrer no dia 26 de Julho de 1983.

 

Los Olvidados

 

Viridiana

 

08 de Janeiro de 2009

Ainda a propósito do post anterior, e de forma a criar, uma vez por outra, um fio condutor que disfarce alguma anarquia existente na publicação de cada post, deixo-vos hoje com o México, lembrado através da pintura, com as visões pictóricas de Rivera e da sua mulher Frida Kahlo, e também recordado através do cinema, com o esplendoroso trabalho que o cineasta espanhol Luís Buñuel fez em Los Olvidados e com o material filmado por Sergei Eisenstein do inacabado e, ainda assim, visualmente formidável Que Viva México!

A fim de acrescentar mais qualquer coisa a uma visão algo redutora e pobre deste país imenso, proponho mais um caminho a seguir. Pela voz de Chavela Vargas (como não podia deixar de ser) e pela voz da, para mim muito mais querida, Lhasa de Sela.

E como quem motivou todo este percurso foi Juan Rulfo, guardo para o final algumas extraordinárias fotografias daquele país, tiradas pelo próprio escritor e que, acompanhadas pelos textos de Carlos Fuentes, Margo Glanz, Jorge Alberto Lozoya, Eduardo Rivero e Víctor Jimenez, integram o prometedor (a julgar pelas fotos disponíveis na net) livro Juan Rulfo’s Mexico.

 

 

 

 

 

 

 

 

DIEGO RIVERA (1886-1957)

 

Como artista excepcional, político militante e contemporâneo excêntrico, Diego Rivera teve um papel primordial numa época muito importante no México. Tornou-se, embora polémico, o mais citado artista do continente hispano-americano no estrangeiro. Foi pintor, desenhador, artista gráfico, escultor, arquitecto, cenógrafo e um dos primeiros coleccionadores de arte mexicana pré-colonial. O seu nome está relacionado com os de Pablo Picasso, André Breton, Leo Trotski, Edward Weston, Tina Modotti e, como não podia deixar de ser, Frida Kahlo. Foi, simultaneamente, alvo de ódio e amor, admiração e rejeição, lendas e difamação. O mito que, ainda em vida, se criou à volta da sua pessoa, não se deve somente à sua obra, mas também ao seu papel activo na vida política da sua época, às suas amizades e aos seus conflitos com personalidades famosas, à sua aparência fascinante e ao seu carácter rebelde.

 

 

Nas suas recordações, difundidas em diversas obras biográficas, Rivera contribuiu bastante para a criação do mito à volta da sua pessoa. Gostava de se apresentar como menino precoce de ascendência exótica, que combatera na Revolução mexicana como jovem rebelde, um visionário que se recusava a fazer parte da vanguarda europeia, e que estava predestinado para ser o cabecilha da revolução artística. A sua biógrafa, Gladys March, confirma, no entanto, que a sua vida real era muito mais banal e que Rivera tinha grandes dificuldades em separar a ficção da realidade: «Rivera, que, mais tarde, iria representar nos seus trabalhos a História do México como um dos grandes mitos do nosso século, não conseguia dominar a sua fantasia fenomenal, enquanto me contava a sua vida. Tinha transformado alguns acontecimentos, principalmente acontecimentos dos seus primeiros anos de vida, em lendas.»

 

Andrea Kettenmann, tradução de Ruth Correia in “Diego Rivera Um Espírito Revolucionário na Arte Moderna”, 2004 Taschen.

 

                     Frida Kahlo

 

 JUAN RULFO'S MEXICO

 

 

 

LOS OLVIDADOS e QUE VIVA MEXICO!

 

 

Sergei Eisenstein "Que Viva México!"

 

Luís Buñuel "Los Olvidados"

 

LHASA e CHAVELA VARGAS

 

 

Chavela Vargas "La Llorona"

 

Lhasa "La Frontera"

 

 

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