Dispensemos, por isso, as exigências da devoção biográfica e lembremos o essencial: que a lenda de Jean Seberg se prolonga (e, a meu ver, se encerra) no filme "Lilith", dirigido por Robert Rossen em 1963. Neste caso ao lado de Warren Beatty, a actriz assume uma personagem que é, em si mesma, a expressão magoada do irremediável do amor, quer dizer, da sua proximidade da loucura. Talvez que a figura marcante de “À Bout de Souffle” e “Lilith” tenha sido mesmo outra coisa que não uma actriz: antes um ser incauto, eternamente inadaptado ao olhar dos outros. Foi isso, pelo menos, que ficou na obra dos grandes autores que a filmaram, oferecendo-lhe sempre o resgate que a própria imagem pode conter. No filme de Rossen, por exemplo, a personagem de Warren Beatty não sabe dizer a sedução de Lilith a não ser pela palavra «arrebatamento» - é a mais pura, porque não admite sinónimos.
João Lopes, Expresso de 16 de Dezembro de 1995