Nelly é uma sobrevivente desfigurada dos campos de extermínio nazis. No pós-guerra, após se sujeitar a uma operação de reconstituição facial que a tornou irreconhecível, regressa a Berlim para encontrar o marido, que, crê-se, a terá traído denunciando-a aos nazis. Quando o localiza, este, não a reconhecendo, propõe-lhe que finja quem realmente é para conseguir a sua herança, procurando tirar proveito daquela que, embora não o saiba, é a própria mulher. Resgatando o legado do cinema clássico americano sob a variação do tema da mulher que se transforma no seu duplo (a presença central de Vertigo, de Hitchcock, mas não só), Christian Petzold, num estilo cada vez mais contido, subtil e depurado, constrói um portentoso e amargo edifício estético que abala qualquer crença no mito da reabilitação súbita da Alemanha do período pós-segunda guerra mundial - regeneração que lhe permitiu renascer das cinzas e tornar-se o principal motor da Europa -, configurando um conjunto de personagens que representa uma prolongada anestesia, um vazio moral e um esquecimento mecanicamente acolhidos. Pleno de contenção, comoção e intensidade, Phoenix, há que dizê-lo sem receio, é uma obra-prima do cinema contemporâneo.