Há qualquer coisa de novo no fado tradicional de Gisela João. Não é bem o timbre da sua voz pois este identifica-se bastante com o da voz de Amália, embora já impressionem a forma inesperada como Gisela João se serve da força bruta das cordas vocais e o modo como jorram as emoções à flor da pele. A escolha do reportório também não surpreende, visto que Gisela opta por um conjunto bastante fiel ao fado clássico. Porém, a sua fidelidade à tradição fica-se por aí dado que já é francamente invulgar a eficácia com que a cantora se apropria dos fados escolhidos; atira-se aos seus órgãos vitais, reduz a matéria musical ao essencial e apenas permite que os seus ouvintes escutem a batida do coração, o sopro desmedido da alma à beira do abismo e a gramática singular das malhas quase folk/rock das guitarras. Uma estreia promissora, magnífica e apta a ficar gravada na nossa memória. Um sinal, em suma, do bom momento que o fado atravessa, como testemunha ainda o mais recente trabalho de Pedro Moutinho, O Amor Não Pode Esperar.