Hoje estou aqui para celebrar o verdadeiro acontecimento que é a edição nacional em DVD de dois dos mais extraordinários e importantes filmes do cinema mudo (quero dizer: de todo o cinema). Falo de «Os Nibelungos» (1924) - dividido em duas partes: «A morte de Siegrfried» e «A vingança de Kriemhild» - do genial Fritz Lang e de «Fausto» (1926) do não menos genial F. W. Murnau.
Em «Os Nibelungos» assistimos à oposição entre o mundo masculino de «A morte de Siegfried» e o mundo feminino de «A vingança de Kriemhild», e apercebemo-nos do extraordinário jogo de contrastes entre luz e sombra: a luminosidade da 1.ª parte «contra» o mundo sombrio e interior de «A vingança de Kriemhild».
Muito haverá para dizer sobre esta saga sumptuosa e deslumbrante. Fritz Lang, com uma majestade arquitectónica, começa por nos contar a história épica de um herói mítico e conclui, na 2.ª parte, com um retrato abissal e dramático de uma vida organizada sob o espectro da vingança, do conflito, da morte e das paixões extremadas.
Todo o peso da mitologia está presente neste filme, o qual não deixa, apesar disso ou por essa razão, de ser profundamente humano e de nos tocar de forma tão intensa. E mais não conto porque o essencial mesmo é ver o(s) filme(s).
O mito de Fausto está, por sua vez, presente naquele que é o último filme alemão de Murnau (uma superprodução da época) – autor, entre outros filmes memoráveis, das obras-primas «Nosferatu», «Sunrise» e «Tabu» -, o qual se serve, essencialmente, das adaptações de Goethe e Christopher Marlowe, para completar esta magnífica obra.
Se outras e boas razões não houvesse, só o facto de termos, finalmente, acesso a este filme - tantas vezes inacessível aos olhos que o quiseram ver – merece esta pequena celebração.
Claro que este texto só faz sentido para quem tem memória (e se serve dela) e sabe que o cinema já fez mais de 100 anos. Para os outros, espero que um feliz acaso os faça mudar a sua opinião e se dedicam a algo mais do que ver, apenas, os filmes realizados nos últimos quatro ou cinco anos (mais do que isso já será, para eles, um filme «antigo»).