«Não só no mundo dos negócios, mas também no das ideias, promove o nosso tempo “uma verdadeira liquidação”. Tudo se adquire por um preço tão irrisório, que nos resta perguntar se haverá alguém que acabe por fazer uma oferta. Qualquer “marqueur” especulativo que conscienciosamente aponte o assinalável percurso da filosofia mais recente, qualquer professor livre, assistente, estudante, alguém que esteja por dentro ou por fora da filosofia, ninguém pára para duvidar de tudo, antes avança. Seria porventura inoportuno e extemporâneo perguntar-lhes onde pensam que vão propriamente chegar, mas é sinal de cortesia e modéstia aceitar como facto consumado que duvidaram de tudo, pois caso contrário soaria estranho dizer que “avançaram”. Todos fizeram este movimento preliminar e presumivelmente com tanta facilidade, que nem consideraram necessário deixar cair uma palavra sobre o assunto; pois nem mesmo aquele que angustiado e inquieto procurasse um pequeno esclarecimento encontraria uma coisa parecida, um alvitre sugestivo, uma pequena regra dietética, sobre como proceder perante esta monstruosa tarefa.»
Søren Kierkegaard, Temor e Tremor (1843).