a dignidade da diferença
23 de Fevereiro de 2016

 

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Uma das passagens mais admiráveis do livro Being Mortal ocorre quando o seu autor, o cirurgião, escritor e investigador Atul Gawande, incide sobre a decisão de uma paciente quanto à sujeição ou não a uma cirurgia, após a avaliação dos seus riscos. Atul Gawande explica que «o cérebro dá-nos duas maneiras de avaliar experiências como o sofrimento – há a maneira como apreendemos essas experiências no momento e como as encaramos mais tarde – e essas duas maneiras são profundamente contraditórias». Aproveitando uma série de experiências descritas pelo investigador Daniel Kahneman – que poderão ser lidas na sua obra fundamental, Thinking, Fast and Slow – o cirurgião lança alguma luz sobre o assunto. No seguimento dessas experiências sobreveio um fenómeno que Daniel Kahneman designou como «a regra do pico-fim». Como o próprio esclareceu, esta regra consiste na média da dor sentida em dois momentos significativos: o momento derradeiro e o momento mais doloroso sentido durante a referida operação. Desta resultou a atribuição de dois eus distintos às pessoas: um eu que vive as coisas e um eu que as recorda. A regra do pico-fim, bem como a tendência para as pessoas ignorarem a duração do sofrimento, foi, segundo Daniel Kahneman, confirmada por estudos realizados nos mais variados contextos. «Se o eu que vive e o eu que recorda podem ter opiniões diferentes sobre a mesma experiência, a qual dos dois devemos dar ouvidos?» – interroga-se Atul Gawande. Regressando à decisão que a sua paciente deve tomar, deverá esta observar o eu que recorda e antecipa, convergindo nas coisas piores que poderá sofrer, ou o eu que vive e que terá um nível médio de sofrimento mais baixo no futuro imediato? Com efeito, ao contrário do eu que vive, absorvido no instante, o eu que recorda tenta compreender como se desenvolve a história como um todo. E numa história, sublinhe-se, o final é importante…

 

24 de Maio de 2015

 

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«As possibilidades científicas modernas alteraram profundamente o curso da vida humana. As pessoas vivem mais e melhor do que em qualquer outro período da História. Mas os avanços científicos transformaram os processos de envelhecer e morrer em experiências médicas, questões a serem geridas por profissionais de saúde. E nós, no meio médico, demos assustadoramente provas de não estarmos preparados para isso. Esta realidade tem estado, em grande parte, escondida, uma vez que as fases finais da vida são cada vez menos familiares para as pessoas. (…) A morte, como é óbvio, não é um fracasso. A morte é normal. A morte pode ser o inimigo, mas é também a ordem natural das coisas. (…) Não é preciso passar muito tempo com pessoas idosas ou doentes em fase terminal para ter a noção da quantidade de vezes que a Medicina não consegue socorrer as pessoas que supostamente deveria ajudar. Os derradeiros dias da nossa vida são ocupados com tratamentos que nos baralham o cérebro e sugam o nosso corpo até ao tutano, em busca de uma ínfima hipótese de obter um resultado benéfico. São passados em instituições – casas de repouso e unidades de Cuidados Intensivos -, onde rotinas rígidas e impessoais nos afastam de todas as coisas que são importantes para nós na vida. A nossa relutância em analisar honestamente a experiência do envelhecimento e morte agravou o mal que infligimos às pessoas e negou-lhes os confortos básicos de que mais necessitam. (…) Há quem ficará assustado com a ideia de um médico escrever sobre a inevitabilidade do declínio e morte. Para muitas pessoas, este tipo de conversa, por mais cuidado que se tenha a enquadrá-la, evoca o espectro de uma sociedade a preparar-se para sacrificar os seus doentes e velhos. Mas, e se (…) já estiverem a ser sacrificados, já forem vítimas da nossa recusa em aceitar a inexorabilidade do ciclo da vida?»

Atul Gawande, Introdução a Being Mortal.

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