a dignidade da diferença
01 de Janeiro de 2014

Fim da recolha. Entre novidades e (primeiras) reedições, sem restrições de categorias ou géneros musicais, aqui ficam os discos que mais gostei de escutar em 2013 – no total são trinta discos os escolhidos. Destaque merecido para o opus 2 de Anna Calvi, o extraordinário e inesperado regresso da folk de Linda Thompson, a feliz aventura jazzística de June Tabor (no coletivo Quercus), Machineries Of Joy, dos British Sea Power, em cujas veias circulam revitalizados a tensão e o magnífico sangue musical dos Echo & The Bunnymen, o instinto melódico conjugado com o experimentalismo subtil do último trabalho de Laura Veirs, e para a reedição da obra integral da admirável Banda do Casaco. De fora ficaram, injustamente, Shaking the Habitual, dos arrojados The Knife - embora de digestão algo difícil, mas o futuro pertence-lhes -, o precioso classicismo de Electric, de Richard Thompson, ou o mais recente, introspectivo e belíssimo trabalho dos These New Puritans. Não é possível, contudo, incluir todos. The Jazz Age, da Bryan Ferry Orchestra, e The Sparrow, de Lawrence Arabia, também ficaram de fora. Estes, porém, deixei-os à margem por outra razão. Embora só os tenha escutado em 2013, foram na realidade publicados durante o ano de 2012.

 

  

  

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

01 de Dezembro de 2013

 

 

Cruzamento dos polos musicais oriundos dos Plexus e da Filarmónica Fraude (cuja obra também merecia uma reedição urgente), a Banda do Casaco, quando nasce, reúne no seu seio as ideias e o espírito desalinhados dos seus fundadores essenciais, Nuno Rodrigues (compositor) e António Pinho (autor dos textos), sujeitando-se a sucessivas alterações dos seus membros - por lá passou alguma da nata de músicos portugueses. Politicamente agnóstica – na feliz expressão do crítico João Lisboa -, embora participante e opinativa, a Banda do Casaco, numa época politicamente tão marcada – os anos setenta e a primeira metade dos anos oitenta do século passado –, fez naturalmente um percurso estético permanentemente contra a corrente do pensamento então dominante. Simultaneamente provocador, satírico, tradicional e experimentalista, o grupo de Nuno Rodrigues e António Pinho criou um portentoso cocktail sonoro de música medieval, música tradicional portuguesa, andamentos jazzísticos, pop-folk de câmara, convulsões rítmico-melódicas e deliciosos devaneios poéticos.

 

 

Intercalando no seu peculiar laboratório de experimentação pequenas sugestões musicais labirínticas e flutuantes e uma sedutora visão anarco-surrealista, a sua obra foi evoluindo da tradição inicial (cujo pendor medieval já estava, felizmente, contaminado por elementos estranhos ao mesmo), até atingir a pura abstração sonora – com o precioso auxílio da voz imaterial de Né Ladeiras - de Também Eu (1982), atravessando o rigor cénico e a agilidade instrumental no desenvolvimento dos sobressaltos estéticos de Coisas do Arco da Velha (1976), Hoje Há Conquilhas Amanhã Não Sabemos (1976), Contos da Barbearia (1978) e o salto arquitetónico de uma música que abdica sempre da sua zona de conforto de  No Jardim da Celeste (1980). Se, até à data, era praticamente impossível aos seus admiradores reunir a obra integral da Banda do Casaco (Contos da Barbearia, por exemplo, nunca esteve disponível em CD), de Dos Benefícios dum Vendido no Reino dos Bonifácios (1975) ao algo incompreendido artificialismo sonoro de Com Ti Chitas (1984), eis que ela surge agora em duas magníficas caixas (vermelha e negra), com o som remasterizado por José Fortes, as quais ainda oferecem como bónus um conjunto de gravações inéditas, as origens prévias à identidade da Banda do Casaco e um DVD com excertos de concertos ao vivo. Obviamente, reedição do ano.

 

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