a dignidade da diferença
07 de Junho de 2017

 

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«Ao longo destes anos ouviram-me falar muitas vezes de terrorismo e das formas de o combater. Nem todos os terrorismos são iguais nem devem ser enfrentados da mesma maneira, mesmo se os seus efeitos são semelhantes. O que acontece é que, na sua génese, os movimentos ideológicos que dão lugar às distintas classes de terrorismo são diferentes (…). Pode-se afirmar que no mundo coexistem três tipos de organizações terroristas. As ocidentais que por sua vez se desdobram em três grupos: as de reivindicação nacionalista (…), as internacionalistas ideológicas (...) e as de extrema-direita (...). Um outro bloco é compostos pelas organizações terroristas árabes que podem ser de tendência nacionalista, internacionalista ou islamista. E por último, as organizações internacionais islamistas actuais (…). Entre estes três grandes blocos não existiram relações orgânicas ou de cooperação estável. Quer dizer, não existiu uma Internacional do terror, ainda que, pontual ou conjunturalmente, tenham podido existir apoios, ajudas, fornecimento de infra-estruturas, armas e campos de treino. Este tipo de relações também existiu entre as diferentes organizações mafiosas, que além de prestarem ajuda financeira umas às outras, dividiram territórios e âmbitos de actuação ao longo da sua existência. Todavia, ainda que tenham histórias separadas, trajectórias distintas e objectivos diferentes, há uma coisa que as une: a sua ilegalidade, o uso do terror e a clandestinidade (…). A lição mais clara é que contra o terrorismo não há atalhos. Não pode haver porque ainda que a curto prazo se consigam resultados, a longo prazo prejudicam o sistema democrático (…). A maioria das organizações terroristas apresenta uma deformação da realidade que converte aquelas em grupos sectários com uma clara incapacidade para se acomodarem ao debate político. As suas posições radicais impedem-nos, salvo contados casos, de reagir perante as mudanças políticas e sociais que lhes oferecem a possibilidade de abandonar as suas propostas violentas e de se incorporarem no sistema democrático. Além do mais, antes ou depois, atacam os interesses dos povos que dizem defender e recorrem a qualquer argumento para responder contra o Estado de direito com o único fim de se manterem na sua espiral de violência.»

Baltasar Garzón, Un Mundo Sin Miedo 

publicado por adignidadedadiferenca às 12:02 link do post
21 de Agosto de 2011

 

 

«Para Borges, a realidade residia nos livros; em ler livros, em escrever livros, em falar de livros. Intimamente tinha consciência de estar a prolongar um diálogo iniciado há milhares de anos. Um diálogo, em seu entender, interminável. Os livros restauravam o passado. “Com o tempo”, dizia-me ele, “qualquer poema se converte numa elegia.” Não tinha paciência para as teorias literárias em voga e acusava em especial a literatura francesa de não se concentrar em livros, mas em escolas e camarilhas. Adolfo Bioy Casares disse-me uma vez que Borges era o único indivíduo que, no que se refere à literatura, “nunca se entregou às convenções, ao hábito ou à preguiça”. Foi um leitor desordenado que se contentava, muitas vezes, com resumos do argumento e com artigos enciclopédicos, e que por muito que admitisse não ter acabado o Finnegans Wake, podia dar alegremente uma conferência sobre o monumento linguístico de Joyce. Nunca se sentiu obrigado a ler um livro até à última página. A sua biblioteca (que, como a de qualquer outro leitor, era também a sua biografia) reflectia a sua crença no acaso e nas leis da anarquia. “Sou um leitor hedónico: nunca consenti que o meu sentimento do dever interviesse num gosto tão pessoal como a aquisição de livros”.»

Alberto Manguel, in Com Borges, Ambar, tradução de Miguel Serras Pereira.

publicado por adignidadedadiferenca às 00:28 link do post
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