Confesso que nunca tinha ouvido falar do cineasta polaco Jerzy Skolimowski. Embora tenha sentido alguma curiosidade em assistir ao seu último filme – sempre se tratava de um regresso após dezassete anos sem filmar -, por um desses acasos do destino acabei mesmo por fallar a sua exibição nas salas de cinema, quando esteve por cá em cartaz.
Em boa hora decidi ver Quatro Noites com Anna em DVD. Porque raras vezes me senti na presença de um cinema tão obssessivo, belo e comovente, e em que tão pouca luz – usada de modo tão rarefeito - assume uma importância primordial na narrativa.
Um filme denso que nos faz regressar às origens do cinema, onde os gestos assumem um significado muito maior do que as palavras, com um protagonista vítima da sua própria inocência e do seu desejo prematuramente eliminado.
Uma história muito simples contada com um rigor e economia de meios que desde o início nos assombra pela ousadia estética e firmeza de ideias. Há muito tempo que um personagem não me magoava tanto como Okrasa o faz neste filme. Não sei se foi pelo amor oblíquo que o empregado do crematório do hospital sente pela enfermeira Anna ou se foi pela forma como Okrasa aceita sempre as contrariedades da vida – como é assombrosa a sequência em que o seu olhar quase pede desculpa ao chefe por este o ter despedido.
O que sei, e disso tenho a certeza, é que nunca vi como neste filme um adulto amar tanto outra pessoa através dos olhos de uma criança – como esquecer os sublimes planos em que Okrasa vê a sua amada iluminada pelo luar? -, influenciando a vida de Anna com pequenos gestos do quotidiano (durante a noite, ou melhor, as quatro noites), mas sendo incapaz de impor a sua presença.
Depois do magnífico A Man From London de Béla Tarr, chega às minhas mãos mais um exemplo sublime do cinema de autor com origem no leste da Europa. Claro que tenho a perfeita consciência de que o efeito produzido por esta assombração será prodigiosamente ampliado na escuridão, solidão e dimensão de uma sala de cinema.
Da Polónia, com devoção.