Grande interior W11 (segundo Watteau) de Lucian Freud, 1983 e Pierrot Content de Jean Antoine Watteau, 1712
Entre 1981 e 1983, Freud trabalhou nesta obra baseando-se na pintura mais antiga de Watteau, intitulada Pierrot Content.
Enquanto o quadro de Watteau nos mostra um Pierrot sentado entre duas mulheres, com um ar satisfeito, o trabalho de Lucian Freud , numa demonstração inequívoca de originalidade e personalidade, liberta-se da composição original e do conceito que dela se retira. No lugar da graciosidade e da delicadeza que Watteau emprestou às suas figuras, o genial pintor nascido em Berlim desmonta o drama convencional – a cena de sedução e de ciúme - e rejeita qualquer partícula de romantismo existente na obra onde se inspirou, caracterizando as suas personagens num tom desprovido de graça, sem qualquer elegância, tornando-nos espectadores desconfortáveis perante esta aparente desarticulação.
Contudo, tudo está no sítio certo. A forma desajeitada como os modelos de Freud procuram manter uma pose combina na perfeição com a rudeza do cenário – um quarto exíguo que explica a sensação de aperto que nos transmitem aquelas personagens sentadas na cama de ferro.
Um exemplo formidável do realismo de Freud. Se ambas as pinturas «falam» sobre teatro, a de Watteau mostra a sua crença enquanto a de Freud revela toda a sua desconfiança, ou, dito de outro modo, este último liberta, de forma expressiva, os seus modelos dos estereótipos ligeiramente fantasiados do pintor oitocentista.