a dignidade da diferença
28 de Novembro de 2016

 

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«De certo modo a passagem de Maurice Pialat pelo cinema francês pode comparar-se à da sua personagem pela festa (e pelo resto) de Aos Nossos Amores. Também ele veio trazer a desordem e a perturbação à “festa” pós-Nouvelle Vague, provocando, inclusive, com a sua imprevisibilidade, reacções violentas, de que a conquista da Palma de Ouro por Ao Sol de Satanás foi uma das mais mediatizadas. O seu cinema surge como algo de “único” ao lado da produção que lhe é contemporânea, seja ela comercial ou de vanguarda. Realista, sem o ser, inovador dentro da continuidade, os seus filmes são encenados quase sempre de uma maneira que se pode entender como uma forma particular de psico-drama, lançando momentos de perturbação numa cena construída de forma clássica para provocar uma reacção espontânea dos intérpretes, conseguindo que esta se faça de acordo com a psicologia das personagens. (…) Ao explorar este tipo de provocação aos seus colaboradores, Pialat projecta na cena, de forma assumida ou inconsciente, questões de ordem pessoal, da sua relação com o mundo e com os outros. A cena torna-se, assim, uma espécie de psico-drama de características autobiográficas. Pialat talvez tenha sido um dos raros cineastas, à semelhança de um Woody Allen ou de um John Cassavetes nos EUA, cujo cinema é indissociável (…) da sua vida. A comparação talvez se justifique mais em relação a Cassavetes, pela forma como ambos exploram uma “improvisação” ferozmente controlada, na forma como ambos dirigem os actores e num estilo de montagem que reforça a sensação de “desequilíbrio” e improviso».

Manuel Cintra Ferreira, in Psico-drama familiar: o cinema de Pialat 

publicado por adignidadedadiferenca às 20:01 link do post
22 de Novembro de 2016

 

PJ-Harvey-The-Hope-Six-Demolition-Project.jpeg

 

Após o inesperado golpe de rins estético, iniciado com o sereno e quase invisível White Chalk, em 2007, PJ Harvey abandona definitivamente a pele que vestiu durante a intensa, descarnada e eléctrica cavalgada sonora de punk e blues, que alimentou o capítulo inicial da sua carreira - cujo opus magnum será ainda o teatral, dramático, imoral e sedutor To Bring You My Love, de 1995, - e prossegue a via dos doze amargos episódios que compunham o magnífico Let England Shake, o qual, em 2011, serviu de pretexto para fazer a ponte entre o desmedido morticínio da Primeira Guerra Mundial e a hipocrisia da política contemporânea. Nessa linha, PJ Harvey, acompanhada pelo fotógrafo Seamus Murphy, decidiu explorar alguns dos mais recentes e devastados bairros sociais e palcos de guerra contemporâneos (leste do Anacostia, em Washington D.C., Kosovo e Afeganistão), e dessa proximidade no terreno arranca um notável, pujante e arrebatador conjunto de canções eléctricas no qual o saxofone e a percussão marcial assumem uma importância primordial. E é nesse irrepreensível mosaico musical que PJ Harvey, assumindo o papel de documentada repórter de guerra, expõe, com uma admirável precisão clínica, a arrepiante e inabitável realidade, macerada por múltiplas feridas que a crescente perversidade do poder, da religião e das desigualdades sociais impede de cicatrizar. Posicionando-se na dianteira como um dos indiscutíveis do ano, The Hope Six Demolition Project , vibrante colecção de onze corais eléctricos, plenos de acuidade melódica e insistência rítmica, será também, na linha de Let England Shake, um dos grandes discos políticos da última década.

 

 The Wheel

 

09 de Novembro de 2016

 

bisonte.jpg

 

Nós ensinamos a guerra.

Nós construímos a destruição.

Estamos todos muito orgulhosos dos nossos pais,

edificaram um império

com o fio de prumo da espada

e as roldanas ergueram as cabeças tenras nativas

como torrões levantados do solo,

recebendo cartas de aplauso

e terras de comendas,

lavrando solos e espevitando os campos

com o adubo da cinza mortuária.

 

Quando observo o lento corrimão da história,

filhos meus, sou renitente a deslizar a mão

seja para subir seja para descer,

e inglório me estaco no degrau pungente de mim mesmo

e acendo uma luz tíbia de náufrago

na grande escadaria da noite,

mar crespo

colapso dos meus pés enfim perdidos.

Excerto de «Dos Fuzilamentos da Montanha do Príncipe Pío»

 

publicado por adignidadedadiferenca às 23:34 link do post
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