a dignidade da diferença
30 de Setembro de 2016

 

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Richard Wagner chegou a Veneza em Agosto de 1858. Da sua vivência na cidade recorda «uma atmosfera crepuscular e solene», onde conviviam nobreza, beleza e decadência. Por sua vez, os ecos da música de Wagner inspiraram o talentoso Uri Caine a reinventar algumas das suas composições, num registo que viria também a empregar com a música de Mozart, Schumann, Mahler e Bach (numa soberba reinterpretação das Variações Goldberg). Quebrando barreiras e devorando géneros musicais, o modus operandi do Uri Caine Ensemble consiste numa sucessiva aproximação de estilos e eliminação de fronteiras estéticas. Consegui-lo com a agilidade, a organização, a liberdade e, amiúde, a transcendência que Wagner e Venezia revela - no qual, vinte anos praticamente decorridos, ainda sobressai a vitalidade original -, fazendo as apropriações, os arranjos e as improvisações da música do genial compositor e maestro alemão soar de forma quase instintiva e natural, sem perder a erudição dos seus modelos – excertos de Tristão e Isolda, Tannhäuser ou Lohengrin, por exemplo - já é uma proeza que não estará ao alcance de muitos…

 

 

 

publicado por adignidadedadiferenca às 22:15 link do post
25 de Setembro de 2016

 

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 História de uma mulher que perde a sua filha, Julieta marca o regresso de Pedro Almodóvar, com uma adaptação de contos de Alice Munro, ao género que melhor dominou: o melodrama. Se o novo filme do cineasta espanhol não disfarça, nalguns momentos, uma indesejável sensação de déjà vu, também testemunha uma capacidade – que se julgava perdida em Almodóvar – para enfrentar novos territórios estéticos e vivenciais, num gesto artístico de uma firmeza apta a estremecer algumas das nossas velhas convicções. Modelo de contenção e serenidade, ajustadas com o decorrer do tempo, esse velho (e sábio) escultor - como diria Marguerite Yourcenar -, o novo e belo filme de Pedro Almodóvar, lugar frequentado por personagens que vão aprendendo a sobreviver, é seguramente o seu melhor desde Volver.

 

 

publicado por adignidadedadiferenca às 23:56 link do post
19 de Setembro de 2016

 

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Na admirável filmografia de Nicholas Ray estão presentes, na sua essência, uma sensação de perda e de dor magoada dos seus heróis, as personagens emocionalmente desmedidas, o conflito de gerações e as suas relações demasiado humanas, obsessivas e tormentosas. Mas não só, pois a sua obra transmite amiúde uma dimensão trágica, cruel ou confessional, assombrosamente ampliada pelo delírio pungente do cinemascope, corolário estética de uma visão artística fulgurante e personalizada, concretizada numa exploração profunda da vida enquanto experiência humana íntima e irrepetível. Em síntese, o tipo de cineasta cuja obra, atravessando múltiplos géneros, só ganha em ser avaliada no seu conjunto, mesmo os seus filmes mais desequilibrados ou imperfeitos. O modelo (neste caso) tão justamente venerado pelos defensores da política de autores. Numa carreira ilustrada por uma série assinalável de momentos significativos – tais como In a Lonely Place, On Dangerous Ground, The Lusty Men, Johnny Guitar, Rebel Without a Cause, Bitter Victory ou Party GirlBigger Than Life (Atrás do Espelho, com James Mason no papel principal) é um dos mais inesquecíveis e celebrados. Filme soberbo sobre a transição da ansiedade à opressão, Bigger Than Life, na sua lucidez e plena expressividade, tem muitas razões para ser louvado. Uma das menos recordadas, como bem assinalou François Truffaut no seu Les Films de Ma Vie, consiste no modo como Ray «desmontou as relações de um intelectual com a sua esposa».

 

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Passo-lhe definitivamente a palavra: «as relações de um intelectual com a sua esposa, mais simples do que ele, surgem desmontadas com uma lucidez e uma franqueza quase aterradoras. Sim, pela primeira vez, é-nos mostrado o intelectual em casa, na sua casa, na sua intimidade, seguro pela superioridade do seu vocabulário, tendo a seu favor a dialéctica, face a uma esposa que sente as coisas, mas renuncia a dizê-las por não possuir a mesma linguagem. Como muitas mulheres, é fundamentalmente intuitiva e comandada pelo seu amor e sensibilidade. Cinquenta variações deste tema fazem de Atrás do Espelho, independentemente do seu carácter excepcional, um excelente retrato do casamento.» 

 

 

09 de Setembro de 2016

 

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 A dedicação de Giuseppe Verdi à criação da partitura de La Traviata em pouco mais de quatro semanas – mais precisamente entre a estreia de Il Trovatore em Roma, no dia 19 de Janeiro de 1853, e o dia 6 de Março do mesmo ano – ilustra bem a fecundidade do seu génio, bem como o seu desembaraço na composição. Não é esse, contudo, o seu maior feito, pois La Traviata impressiona sobretudo pelo seu estilo tão distinto da ópera anterior, Il Trovatore. Com efeito, enquanto esta última pulsa com as paixões de amor, ódio ou vingança, confinadas aos jardins palacianos, castelos ou masmorras - cenários rigorosamente apropriados ao incentivo de tais sentimentos – a primeira, pelo contrário, quando palpita é de dor e decorre em interiores burgueses, com música a condizer: viva, espirituosa e delicada, tão rica nas suas subtilezas e expressividade melódica que consegue transmitir, ainda hoje, de forma tão cortante e eloquente, as sensibilidades, esperanças e vicissitudes das suas personagens. A versão dirigida pelo maestro James Conlon, com Renée Fleming, Rolando Villazón e Renato Bruson nos principais papéis, advoga de modo convincente.

 

 

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