a dignidade da diferença
27 de Abril de 2016

 

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Samuel Asch, estudante universitário, desiste, após ser abandonado pela namorada, da sua pesquisa universitária – uma tese sobre a evolução da figura de Jesus na perspectiva dos judeus. Sem casa nem emprego, o protagonista do romance aceita o convite para cuidar de Gershom Wald, um septuagenário inválido, numa casa partilhada com Atalia Abravanel, uma mulher ambígua e estranha, mas plena de sensualidade. O interesse de Asch por Atalia e a companhia do velho Gershom Wald são o pretexto para a introdução de uma série de querelas filosóficas e religiosas ou revelações históricas sobre o processo de formação e transformação de Israel: a sua evolução, os conflitos, a violência e o reflexo das cicatrizes do passado; culminando numa interpretação muito peculiar que subverte a imagem do Judas que conhecemos da Bíblia, apresentando-o como o mais leal dos discípulos. Movimentando-se com desenvoltura entre o romance e o ensaio, num ritmo seco e cadenciado, a prosa áspera do escritor israelita, feita sobretudo de observação e pensamento, aperfeiçoada por uma escrita simultaneamente fina e descarnada que a sua vasta experiência lhe confere (texto depurado, quase só osso), desagua numa magnífica, erudita - pois também se aprende neste livro sobre história, política ou religião - e provocante obra sobre a condição humana, especialmente sobre a condição de ser judeu.

publicado por adignidadedadiferenca às 22:34 link do post
24 de Abril de 2016

 

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«No cinema, afirmou-se como estrela em Hollywood nos anos 70, construindo uma personagem grosso modo definida como a de um ícone de presença forte, lacónico em palavras e que, tanto na paisagem do western como na paisagem urbana das histórias policiai, se caracterizou por se colocar sempre não no interior do sistema, não ao seu lado, mas contra ele. Ou, pelo menos, numa posição de desafio sempre que o sentido de justiça lho exigia. Mesmo se logo no início desses anos 70, perseguiu projectos que, como actor, estendessem o seu campo de acção e destruíssem o estereótipo (…) e ainda que fosse quase sempre isso mesmo que tentou nos seus filmes no duplo papel de actor e realizador, o rasto da sua personagem cinematográfica manteve-se durante largo tempo mais poderoso do que os próprios projectos e a própria natureza do trabalho que neles desenvolveu. Se houve, e houve, quem fosse reconhecendo a assinatura de um estilo nos seus filmes como realizador, a consistência da sua abordagem, ainda nessa década, também é certo que lhe foram exigidas provas sobre provas nesse capítulo. (…) Sendo algo de profundamente enraizado na prática cinematográfica de Eastwood, a tradição do cinema clássico nunca é um modelo nos seus filmes. Ele não é o último dos clássicos muito embora a designação seja mais do que apregoada, tentadora. É alguém directamente vindo do cinema clássico, formado no cinema clássico, alguém cujo cinema tem e guarda o lastro do cinema clássico, mas que tem um olhar moderno. Como no princípio, continua a falar do cinema como um meio de contar histórias e é para contar histórias, diz ele ainda, que continua a filmar.»

Maria João Madeira, in Clint Eastwood, Um Homem Com Passado

 

13 de Abril de 2016

 

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Se há razões para recear que o jazz se converta brevemente numa língua musical morta, também se descobrem paradoxalmente vestígios de grande vitalidade. Com efeito, Michael Formanek, uma das vozes mais originais e estimulantes do jazz contemporâneo, autor de um curto mas valioso percurso musical, juntou-se desta feita ao Ensemble Kolossus para renovar de forma simultaneamente equilibrada, rigorosa e exuberante o conceito e a escrita das grandes orquestras de jazz, ampliando o percurso estético percorrido pela meritória Maria Schneider Orchestra. Recolhendo o melhor da tradição e contextualizando-a no mundo do jazz contemporâneo, a exímia formação liderada pelo contrabaixista, configurando em The Distance uma formidável gestão do tempo e do espaço, reinventa e desenvolve um ambiente de grande unidade e diversidade harmónica, rítmica e melódica, no qual convivem naturalmente peças de sublime e tocante melancolia, em contraponto com outras de puro divertimento, hipnóticas ou alucinadas, mas sempre enérgicas, inventivas e arrebatadoras.

 

 

07 de Abril de 2016

 

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«O pai de Atalia sonhava que judeus e árabes se amariam desde que a incompreensão existente entre eles desaparecesse. Mas enganou-se. Entre judeus e árabes nunca existiu incompreensão. Pelo contrário. Há dezenas de anos que entre ambos existe um entendimento absoluto e total: os árabes naturais desta terra estão ligados a ela porque é a única que têm, não têm outra, e nós também estamos ligados a ela pela mesma razão. Eles sabem que nós nunca desistiremos dela e nós sabemos que eles também nunca desistirão dela. Esse entendimento mútuo é perfeitamente claro. Não existe nem nunca existiu incompreensão. O pai de Atalia era daquelas pessoas que acham que todos os conflitos no mundo se resumem a equívocos: com uma pequena dose de aconselhamento familiar, um pouquinho de terapia de grupo, uma gotinha ou duas de boa vontade – tornamo-nos imediatamente irmãos de coração e alma e a disputa cessa. Ele acreditava que bastava que os elementos em conflito se conhecessem para que se estimassem. (…) Mas eu digo-lhe, meu caro, que dois homens que amam a mesma mulher, dois povos que reivindicam a mesma terra, por muitos rios de café que bebam, esses rios não apagarão o ódio, as muitas águas não o extinguirão. E digo-lhe ainda, apesar de tudo o que lhe disse antes, que abençoados sejam os que têm sonhos, e maldito aquele que lhes abre os olhos. Pois ainda que os sonhadores não nos salvem, nem eles nem os seus discípulos, a verdade é que sem sonhos e sem sonhadores a maldição que sobre nós pesa será sete vezes maior. Graças aos sonhadores talvez nós, os lúcidos, sejamos um pouco menos empedernidos e desesperados do que seríamos sem eles.»

Amos Oz, in Judas

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