O primeiro facto a reter é o ciclo sobre o cinema do brasileiro Glauber Rocha, programado pela Cinemateca Portuguesa para este mês de setembro. Oportunidade para recuperar a urgência, a atualidade e as fascinantes contradições da visão simultaneamente poética, desencantada e surreal dos ainda hoje magníficos Deus e o Diabo na Terra do Sol, Terra em Transe ou António das Mortes, entre outros cuja dinâmica seria um erro menosprezar. E, face aos tempos conturbados por que passamos, o cinema de Glauber Rocha é também uma excelente oportunidade para (re)pensar o modo de viver no mundo contemporâneo.
O título poderia ser A racionalidade das pessoas pobres. Uma obra onde os seus autores, Abhijit V. Banerjee e Esther Duflo, professores de economia nos EUA, avançam com um conjunto de ideias diferentes e ousadas sobre o modo como enfrentar o eterno problema da luta contra a pobreza e ultrapassar o dogma do fracasso a que, regra geral, está condenada. Fica desde já um aviso deixado pelos autores, o qual passo a citar: «a maioria dos programas destinados aos pobres em todo o mundo é financiada pelos recursos dos próprios países pobres». Um trabalho honesto e militante.
O reportório de Beethoven reinterpretado por Andreas Staier. Um trabalho analítico, tenso e elaborado do assombroso cravista alemão, no qual transparence claramente uma releitura profundamente pensada e personalizada que sujeita as abissais Variações Diabelli, de Beethoven - cuja dimensão estética ainda hoje impressiona, sobretudo quando comparada com a obra dos compositores seus contemporâneos -, a prodigiosas e inventivas modificações, permitindo quase milagrosamente uma audição renovada, sem, contudo, descaracterizar o essencial da sua matriz musical original. Um disco raro e esplêndido.