A primeira série servia-se dos grandes acontecimentos históricos como muleta para o desenvolvimento ficcional. Sabemos da existência da terceira parte, mas confessamos que nunca lhe passámos os olhos por cima. Mas o quotidiano vivido pelo núcleo fundamental de personagens na Munique dos anos 60, narrado em Heimat II, dificilmente esqueceremos. A raiz popular, o destino individual dos protagonistas, os seus amores, a amizade e a música que os une, as suas esperanças e decepções, as ilusões, a separação dos caminhos inicialmente comuns, todos estes factores compõem a matriz, a estrutura ficcional, desta série fabulosa. Parece uma telenovela? Talvez. Mas a estilização e a pertinência dos planos, trabalhados por quem rejeita que a sua importância seja medida ao minuto, o sentido estético, a ambição artística, a profundidade temática – que só raríssimas das melhores séries norte-americanas conseguem alcançar -, a inteligência e o cuidado formal revelados no uso dos materiais fílmicos, escapam notavelmente ao conformismo estético e à banalidade narrativa comuns às telenovelas.
Recordamo-nos que Heimat II passou na RTP2, no início dos anos 90 (Heimat I também fora exibida no canal público), mas, agora, quem teria coragem para incluir esta série na sua programação? A terceira parte, pelo menos, porque nunca foi apresentada. Infelizmente, os canais privados estupidificam quem os procura com a mediocridade generalizada dos seus programas, onde vence a humilhação pessoal e a divulgação da vida íntima das pessoas. Resta o segundo canal da televisão pública (ou, talvez, a RTP Memória…), mas este tornou-se numa autêntica manta de retalhos. Não há uma divulgação cultural minimamente reflectida. Não assistimos a uma organização temática sobre cinema, documentários, teatro, ópera, ballet, música clássica ou popular, política ou literatura. Assim, como facilmente se percebe, dificilmente voltaremos a ter na sua programação uma série como Heimat.