Com o mais recente e notável Sacanas Sem Lei (Inglourious Bastards no original), Quentin Tarantino volta a conquistar, merecidamente, a unanimidade da crítica nacional (e internacional). Fui ver o filme no passado fim-de-semana e, genericamente, estou de acordo com os (muitos) elogios que lhe foram dispensados.
Acusado injustamente de auto-indulgência (principalmente) no filme anterior, o magnífico e deliciosamente frívolo Death Proof – só as reflexões morais é que são pertinentes no cinema? -, Tarantino, desta vez, esmera-se sobretudo no fabuloso argumento, nos diálogos cortantes e geniais, e na criação e domínio perfeito dos momentos de tensão, visitados, não raras vezes, pelo peculiar e vertiginoso sentido de humor e de puro gozo com que o cineasta doseia insustentáveis ambientes de cortar à faca.
Ficcionando, com o seu estilo particular, a história da «França ocupada» durante a Segunda Guerra Mundial, Tarantino vai buscar a sua inspiração aos filmes de aventuras, ao western-spaghetti de Sergio Leone ou aos filmes de guerra de série Z, reescrevendo, num ritmo endiabrado, violento (sou incapaz de esquecer o arrepio que senti quando os judeus americanos escalpam os nazis que matam), divertido ou, literalmente, incendiário, a sua visão alternativa da Segunda Grande Guerra.
Se todo o filme é magnífico, para mim bastava a encenação portentosa da morte da família judia de Shosanna ou essa criação admirável que é o caçador de judeus nazi, interpretado de forma assombrosa por Christoph Waltz, tão capaz de ser assustador e cruel como de se tornar o mais perfeito gentleman, para tornar Sacanas Sem Lei naquilo que ele, justamente, é: um divertimento delicioso e, simultaneamente, assustador, fruto do talento de um cineasta que manifesta uma inabalável fé no cinema, no poder das palavras e, sobretudo, no poder das imagens.