Blackfriars
Era o herói da erva.
Tinha para vender
e o corpo.
Nem os olhos, nem a alma
sabia emprestar. Trazia
nos punhos íngremes
metais de marca, duas estrelas
para vigiar-lhe o destino.
Sem luz aos ombros partia,
campeão do sonho sem partilha.
Tremiam-lhe os dedos, um resto
de coração vibrava delirado
noutro corpo. Cortado pelo gume
das lágrimas o amor, longa
escadaria sem patamares
ou portas possíveis.
Fernando Luís, «Sólon» 1987
DOIS RIOS
O corpo dividido em duas partes
fechadas
à chave uma na outra, avanço
num duplo coração como se fosse
ao mesmo tempo num só barco por dois rios.
Luís Miguel Nava, «O céu sob as entranhas» 1989