«Penso, na verdade, que há alguma coisa correcta no relativismo cultural, e quero agora passar a dizer o que é. Há duas lições que devemos aprender com a teoria, ainda que acabemos por rejeitá-la. Primeiro, o relativismo cultural alerta-nos, de maneira correcta, para os perigos de pressupor que todas as nossas preferências estão fundadas numa espécie de padrão racional absoluto. Não estão. Muitas das nossas práticas (mas não todas) são particularidades exclusivas da nossa sociedade, e é fácil perder de vista esse facto. Ao recordar-nos isso, a teoria presta um bom serviço. (…) A segunda lição relaciona-se com a necessidade de manter o espírito aberto. No processo de crescimento, cada um de nós adquiriu algumas convicções fortes: aprendemos a aceitar alguns tipos de conduta e a rejeitar outros. Podemos, ocasionalmente, ver essas convicções postas à prova. (…) O relativismo cultural ao sublinhar que as nossas perspectivas morais podem reflectir preconceitos da nossa sociedade, fornece um antídoto para este tipo de dogmatismo. Quando conta a história dos Gregos e Calatinos, Heródoto acrescenta: Se se propusesse, fosse a quem fosse, que escolhesse de entre todas as tradições culturais as melhores, cada um, depois de reflectir maduramente, escolheria a sua, convencido que está de que a tradição em que nasceu é de longe a melhor. Perceber isto pode levar-nos a uma maior abertura de espírito. Podemos compreender que os nossos sentimentos não são necessariamente percepções da verdade – podem não ser mais do que o resultado do condicionamento cultural. Assim, quando ouvimos alguém sugerir que um aspecto do nosso código social não é realmente o melhor, e damos por nós a resistir a esta sugestão, podemos parar e recordar isto. Podemos ficar então mais abertos à descoberta da verdade, seja ela qual for.»
Rachels, James, Elementos de Filosofia Moral, Gradiva, 1.ª Edição, 2004. Tradução de F. J. Azevedo Gonçalves